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quarta-feira, 4 de setembro de 2019

Epidemia de aids não terá fim sem ações direcionadas, diz OMS

Jornal do Comércio - 23/07/2018 

(https://www.jornaldocomercio.com/_conteudo/geral/2018/07/639737-epidemia-de-aids-nao-tera-fim-sem-acoes-direcionadas-diz-oms.html)

Agência Brasil 

O diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus, disse nesta segunda-feira (23) que a epidemia de HIV no mundo não terá fim sem que haja políticas direcionadas para as chamadas populações-chave, sobretudo gays, homens que fazem sexo com homens, trabalhadores do sexo, usuários de drogas e população LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, transsexuais e transgêneros).  

"A melhor forma de abordar todo o espectro de suas necessidades de saúde é por meio de sistemas de saúde fortes baseados numa atenção primária centrada nas pessoas e que seja direcionada para alcançar saúde para todos", publicou Tedros em seu perfil na rede social Twitter. 

O diretor-geral da OMS participa nesta segunda da cerimônia de abertura da 22ª Conferência Internacional sobre Aids, que ocorre até a próxima sexta-feira (27) em Amsterdã, na Holanda. O encontro é considerado o maior do mundo sobre o tema e deve reunir especialistas em ciência, direitos humanos e defesa dos interesses de quem vive com HIV. 

O tema deste ano é Quebrando Barreiras, Construindo Pontes. A proposta é chamar a atenção para desafios como estigma, preconceito e outros problemas enfrentados por quem vive com o vírus em algumas partes do mundo, incluindo populações-chave do leste europeu e da Ásia Central, assim como do Oriente Médio e do Norte da África.  

Dados da OMS revelam que homens que fazem sexo com homens, trabalhadores do sexo, pessoas transexuais, usuários de drogas e pessoas encarceradas respondem por 40% das novas infecções por HIV registradas em 2016.


Jornal do Comércio (https://www.jornaldocomercio.com/_conteudo/geral/2018/07/639737-epidemia-de-aids-nao-tera-fim-sem-acoes-direcionadas-diz-oms.html)

domingo, 18 de agosto de 2019

Após marco em política de redução de danos, país vive retrocesso

Há 30 anos, Santos protagonizava troca de seringas para frear epidemia de Aids

Cláudia Collucci, FSP, 16.abr.2019

Com a decisão do governo de Jair Bolsonaro (PSL) de excluir a redução de danos na sua nova política de drogas, priorizando o tratamento baseado em abstinência, o Brasil dá um enorme passo atrás em uma iniciativa considerada um marco da saúde pública na prevenção das consequências negativas associadas ao uso das drogas.

Programas de redução de danos não cobram abstinência como condição para o tratamento. São direcionados para usuários que não querem ou que não conseguem parar o consumo de drogas. O conceito remonta à Inglaterra de década de 1920, do pós-guerra. Muitos soldados que lutaram na Primeira Guerra Mundial foram tratados com morfina e se tornaram dependentes de opioides. 

Por uma questão de patriotismo, já que se tratavam de heróis da guerra, o próprio governo britânico autorizou que médicos prescrevessem ópio a dependentes em situação de risco.

A proposta voltou à tona na década de 1980, na Holanda. Na época, crescia a disseminação de hepatite B pelo compartilhamento de seringas contaminadas. Com a perspectiva de que uma epidemia de hepatite afetaria a sociedade como uma todo, não só os usuários de drogas, o governo implantou o primeiro programa de troca de seringas em Amsterdã, em 1984.

Depois disso, em países como Suíça, Espanha (1990) e França (1994) surgiram programas não só de substituição de seringas para frear a epidemia de Aids entre os usuários de drogas injetáveis como também de tratamentos que substituíam o ópio e a heroína por metadona (droga também à base de ópio, porém, de ação mais lenta).

Um estudo da Universidade Pierre e Marie Curie (Paris), publicado em 2006, demonstrou que caíram as taxas de incidência de infecção por HIV entre os usuários de drogas injetáveis após a adoção desses programas: a França, entre 1994 e 2002, observou queda de 23% para 14%. Na Espanha, entre 1996 e 2002, o índice passou de 38% para 33%. Houve queda também de mortes por overdose. Na França, de 588 para 89, entre 1994 e 2003. E na Espanha, de 579 para 221, entre 1991 e 2002.

Há 30 anos, Santos (SP) protagonizava a adoção da primeira política de redução de danos do Brasil. Em 1989, o município passou a distribuir seringas aos usuários de drogas injetáveis para que deixassem de compartilhá-las, evitando, dessa forma, novas infecções por HIV. Com a medida, a prática que era adotada por 70% dos usuários caiu para 20%, segundo estudos feitos naquele período.

O programa também previa a acompanhamento para a redução gradual do consumo e, ao longo prazo, reinserção do usuário na sociedade. Mas foi encerrado após pressão do Ministério Público.

Em 2005, uma portaria do Ministério da Saúde viria a regulamentar os programas de redução de danos como política de saúde pública, mas, na realidade, eles nunca passaram de experiências pontuais. 

Em São Paulo, em 1999, dependentes de crack foram estimulados a consumir maconha em um estudo coordenador pelo psiquiatra Dartiu Xavier, da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).

O trabalho acompanhou 25 usuários de crack por seis meses, que substituíram a droga por maconha. Ao final desse período, 17 tinham abandonado o crack. Ganharam peso e retomaram atividades como estudar e trabalhar. Dos oito restantes, quatro abandonaram o tratamento e outros quatro não conseguiram deixar o crack.

Em 2017, uma pesquisa da Universidade da Columbia Britânica, no Canadá, revisou três estudos que acompanharam 300 usuários de crack no país, sendo que desses, 122 usavam maconha como alternativa. Trinta meses depois, as chances desse grupo reduzir o consumo de crack foram 89% maiores.

O fato é que existe um acúmulo de experiências suficiente para demonstrar que a redução de danos, associada a outras medidas, é uma alternativa efetiva para uma parcela dos usuários. Pode prevenir outros danos associados ao uso de drogas pesadas, como perda de emprego e quebra de vínculos familiares e sociais.

Mas, a despeito das evidências, o atual governo quer se apoiar apenas no tratamento baseado em abstinência que, segundo a literatura médica disponível, seria eficaz para, no máximo, 30% dos usuários. Ou seja, o Brasil investirá numa política que fracassa em 70% dos casos.

Nos últimos anos, as comunidades terapêuticas, que pregam a abstinência, ganharam espaço, apesar das polêmicas em torno desse modelo. Em artigo publicado na Revista Internacional de Direitos Humanos, o psiquiatra Luís Fernando Tófoli, professor da Unicamp, diz que os mecanismos regulatórios frouxos das comunidades terapêuticas podem resultar em sérios riscos de violações aos direitos humanos e doutrinação religiosa como forma de tratamento aos usuários. Isso tudo com financiamento estatal. 

Ele cita um relatório do Conselho Federal de Psicologia, de 2015, que apontou sérias violações aos direitos humanos em serviços de tratamento para usuários problemáticos de drogas. Entre elas, cárcere privado, trabalho análogo à escravidão e desassistência sanitária.

Não se sabe quantas comunidades terapêuticas no país vivem situações graves como essas. Por isso, é fundamental que esse setor seja investigado e muito bem regulado, especialmente agora que ganha força (e mais recursos públicos) na nova política de drogas. 

Por último, vale lembrar que, em 2017, na 70ª Assembleia Mundial da Saúde, a OMS (Organização Mundial da Saúde) recomendou a adoção de estratégias de redução de danos como forma de lidar com as questões sociais associadas à dependência de drogas e garantir acesso a serviços de saúde.

Ao excluir a redução de danos no tratamento de usuários de drogas, o governo Bolsonaro abraça uma visão moralista e religiosa sobre a dependência, que não encontra amparo na boa ciência. 

Brasil participará de fase avançada de teste de vacina contra HIV

3.800 voluntários de oito países devem participar do ensaio clínico

Matheus Moreira - FSP, 24.jul.2019

Uma vacina preventiva contra o HIV deve passar pela última fase de testes em humanos em oito países da Europa e da América, entre eles o Brasil, para avaliação de sua eficácia.

A pesquisa, apelidada de Mosaico por juntar vários subtipos do vírus para formar uma proteção ampla, está na fase 3. Esse é o estágio mais avançado dos testes antes de a imunização ser aprovada. Nessa etapa, milhares de voluntários recebem a vacina para que a capacidade de prevenir novas infecções seja avaliada.

A vacina, iniciativa do NIH (Institutos Nacionais de Saúde) dos EUA, será testada em 3.800 homens e pessoas transexuais que mantêm relações sexuais com homens e transexuais e que tenham entre 18 e 60 anos. Nos EUA, as inscrições devem começar ainda em 2019. 

No Brasil, a Faculdade de Medicina da USP será uma das instituições parceiras envolvidas no teste, segundo Esper Kallás, imunologista e professor da FMUSP (Faculdade de Medicina da USP). Ele afirma, porém, que ainda deve demorar alguns meses até que se possa falar em inscrições de voluntários. A FMUSP recebeu apenas uma carta oficializando a parceria e aguarda os protocolos do teste.

O público-alvo tem a ver com a alta prevalência do HIV entre homens gays e bissexuais e mulheres transgênero. Nos EUA, a população gay e bissexual (que representa 4% do total) responde por um terço dos novos casos de HIV, de acordo com o Centro de Controle e Prevenção de Doenças americano. O órgão também aponta que pelo menos 14% das mulheres transgênero americanas têm o vírus.

O Mosaico avaliará se a vacina induzirá respostas imunes contra múltiplos subtipos do HIV. 

Um outro estudo complementar realizado apenas com mulheres (2.600 voluntárias) em cinco países da África Austral, chamado de Imbokodo, encerrou as inscrições em maio de 2019 e deve apresentar seus primeiros resultados em 2021. 

Um terceiro estudo, que foi lançado no fim de 2016, passou por uma atualização e encerrou apenas neste ano a inscrição dos 5.400 voluntários homens e mulheres sexualmente ativos entre 18 e 35 anos. 

Todos os participantes do Mosaico receberão um kit de prevenção contra HIV, incluindo o PrEP (Profilaxia pré-exposição), medicamento utilizado para impedir o contágio pelo vírus. Além disso, os voluntários receberão, de forma aleatória, a vacina experimental ou uma injeção sem efeito. 

A vacina será administrada quatro vezes ao longo de um ano. As duas doses iniciais utilizam um composto criado a partir de um vírus de resfriado modificado e que não causa a doença para “entregar” quatro imunógenos —substância que induz respostas imunológicas. Já as duas doses finais serão compostas por proteínas do envelope viral de dois tipos de HIV.


Como funcionam as vacinas
1
Uma versão mais fraca ou morta (fragmentada) do patógeno (como o vírus HIV) é injetada na pessoa
2
Essas versões não causam a doença e o corpo cria anticorpos para lutar contra
esses patógenos ou pedaços deles
3
Se os patógenos de verdade atacarem, os anticorpos já produzidos pelo organismo os combaterão e a doença não terá chance de se instalar

Como será o novo estudo

Público
A pesquisa de fase 3 (a última antes da comercialização, caso os resultados sejam positivos) vai convocar 3.800 homens sem HIV e pessoas transgênero entre 18 e 60 anos que fazem sexo com homens e/ou transgêneros

Locais
As inscrições devem começar neste ano nos EUA. Também vão participar Brasil, Argentina, Itália, México, Polônia, Espanha e Peru

A vacina

• O estudo vai avaliar uma vacina baseada em "imunógenos mosaico", com elementos de diferentes subtipos de HIV, que poderiam induzir uma resposta imune contra uma grande variedade de cepas do vírus

• Diferentes subtipos de HIV predominam em diferentes regiões do mundo. O C é comum no sudeste africano, enquanto o B é predominante na Europa e na América


• A vacina é uma parceria público-privada entre a farmacêutica Janssen e o Instituto Nacional de Alergias e Doenças Infecciosas (NIAID), um órgão público americano

quinta-feira, 3 de janeiro de 2019

12.2015 - Apps de paquera provocam alta nos casos de HIV entre jovens, adverte ONU

DA BBC BRASIL - 02/12/2015

O aumento no uso de aplicativos de paquera é um dos principais fatores responsáveis por uma nova epidemia de HIV entre jovens homens gays, aponta um estudo do Unicef (braço das Nações Unidas para infância e juventude).
O foco da nova pesquisa, divulgada nesta semana, é a região da Ásia-Pacífico, que inclui países como China, Japão, Indonésia e Tailândia, além de nações da Oceania.

A conclusão é que a região - que concentra metade do 1,2 bilhão de adolescentes do mundo - enfrenta uma "epidemia oculta" de HIV entre jovens de 15 a 19 anos. Houve 50 mil novos casos nessa faixa etária em 2014, o que representa 15% das infecções registradas na região no período.

Apenas nas Filipinas, os registros absolutos anuais passaram de 800 para 1.210 entre 2010 e 2014, um salto de mais de 50%.

O estudo de dois anos conclui que aplicativos de paquera para celular elevaram as opções de sexo casual em uma escala sem precedentes.

"A explosão de aplicativos de paquera gay para smartphones expandiu como nunca as opções para sexo espontâneo casual - usuários dos aplicativos móveis na mesma vizinhança (quando não na mesma rua) podem se localizar e marcar um encontro sexual imediato com apenas alguns toques na tela", afirma o relatório da pesquisa.

Embora as confirmações de HIV positivo estejam caindo no quadro geral, os índices vêm avançando entre segmentos específicos da população da região, como jovens homens gays, homens que se relacionam sexualmente com homens, jovens que fazem sexo por dinheiro, jovens usuários de drogas injetáveis e jovens transgênero.

A epidemia avança mais rápido - sobretudo em grandes cidades, como Bangcoc (Tailândia), Jacarta (Indonésia) e Hanói (Vietnã) - entre homens jovens que fazem sexo com homens e jovens usuários de drogas injetáveis. Segundo o Unicef, essa tendência coincide com um aumento no comportamento de risco, como envolvimento sexual com múltiplos parceiros e uso irregular de preservativos.

"Jovens homens gays nos afirmaram com frequência que agora estão usando aplicativos de paquera para encontros sexuais, e que estão tendo mais sexo casual em decorrência disso. Sabemos que esse tipo de comportamento de risco aumenta a disseminação do HIV", afirmou ao jornal britânico The Guardian Wing-Sie Cheng, consultor do Unicef para HIV/Aids no leste da Ásia e Pacífico.

Pressão e exclusão

"Eu era muito vulnerável ao HIV antes mesmo de fazer 18 anos. Era quando estava explorando minha sexualidade e buscando meios de lidar com a pressão da escola e das grandes expectativas da família. Também tinha depressão crônica, principalmente diante de frustrações românticas. Por causa disso, mantinha sexo sem proteção com diferentes garotos que mal conhecia e que encontrei por redes sociais na internet", afirmou ao estudo um rapaz filipino de 28 anos, identificado apenas como J.A.

A pesquisa reconhece que os setores mais vulneráveis a epidemia são também os mais marginalizados, não raro rejeitados pelas famílias e ignorados por serviços públicos de saúde e educação.

"Embora as circunstâncias sociais e econômicas possam variar, são jovens afetados pelas inseguranças emocionais da adolescência, como a expectativa de cumprir papeis de gênero e baixa autoestima (...). Jovens também costumam acreditar que não correm risco, mesmo considerando que outros com o mesmo comportamento estão em perigo", afirma o relatório.

Tecnologia como educação

O estudo do Unicef cita a possibilidade de usar aplicativos de paquera populares na região, como Jack'd, Blued e Grindr, para promover educação sexual e estimular, por exemplo, os exames para verificação da infecção por HIV entre a juventude ultraconectada.

Os indicadores de inclusão digital na região atestam o potencial da ideia: são 3,7 bilhões de conexões móveis, 1,4 bilhão de usuários ativos de internet e quase 1 bilhão de usuários de redes sociais em dispositivos móveis.

"Estamos convencidos de que existe uma relação (entre uso de aplicativos e aumento nos casos de HIV), e que precisamos trabalhar melhor com os provedores de aplicativos para compartilhar informação sobre HIV e proteger a saúde dos adolescentes", completou Cheng ao jornal britânico.

Mas a estratégia pode não ser eficaz, como disse ao The Guardian Jesse Krisintu, que trabalhou em projetos de incentivo ao teste de HIV em jovens por meio de táticas como anúncios de aplicativos de paquera.

Segundo ele, uma iniciativa que oferecia descontos em testes de HIV nesses anúncios teve retorno pífio - a maioria dos usuários fechava a publicidade imediatamente.

"É o negócio deles (dos sites de paquera). Se anunciarem muito sobre HIV e Aids você acha que as pessoas irão usá-los?", questionou.

Mortalidade

Outra conclusão da pesquisa é que adolescentes são mais vulneráveis a morrer de causas relacionadas à Aids, por causa de fatores como diagnóstico tardio e menor propensão a buscar tratamento, muitas vezes por temor de estigmatização ou de expor a sexualidade a familiares ou autoridades.

Pelo menos 18 países da região criminalizam as relações homossexuais, o que desencoraja homens gays a buscar tratamento, segundo a ONU.

Apenas no sul da Ásia, as mortes ligadas ao HIV entre pessoas de 10 a 19 anos quase quadruplicaram de 2001 a 2014: elas foram de 1,5 mil pra 5,3 mil. Para a Unicef, se a epidemia da síndrome entre adolescentes não for combatida, não será possível cumprir a meta da ONU de retirar, até 2030, a Aids da lista de ameaças globais à saúde pública.
Embora o estudo da Unicef não aborde o Brasil, dados oficiais mostram que a incidência de infecção por HIV está aumentando entre jovens de 15 a 24 anos.


Segundo o Ministério da Saúde, o índice por 100 mil habitantes passou de 9,6 em 2004 para 12,7 em 2013. Foram 4.414 novos jovens detectados com o vírus em 2013, ante 3.453 em 2004. 

sexta-feira, 30 de novembro de 2018

Perspectivas Brasil 2019



30/11/2018 - 19h17
Especialistas temem uma guinada conservadora nas políticas de combate ao HIV durante governo Bolsonaro
http://agenciaaids.com.br/noticia/especialistas-temem-uma-guinada-conservadora-nas-politicas-de-combate-ao-hiv-durante-governo-bolsonaro/

Em 2010, quando ainda não falava em concorrer ao Planalto, o então deputado Jair Bolsonaro fez um comentário que causou algum escândalo. Ao programa CQC, disse que discordava do programa brasileiro de combate ao HIV/aids. Segundo ele, as pessoas infectadas pelo vírus não deveriam ter o tratamento com antirretrovirais custeado pelo Estado: “O pessoal vive na vida mundana e depois vem querer cobrar do poder público um tratamento que é caro”, afirmou, no seu tom belicoso característico.
De lá para cá, Bolsonaro foi de deputado federal a presidente eleito. E suas manifestações mais inflamadas deixaram de causar escândalo para provocar preocupação. Hoje, entidades e especialistas que acompanham o esforço brasileiro no combate ao HIV temem que as opiniões do presidente antecipem mudanças nos programas do Ministério da Saúde nesse campo. “Nosso temor é de que o governo deixe de fazer política baseada em evidências científicas para fazer políticas baseadas em valores morais”, disse-me o sociólogo Alexandre Grangeiro, pesquisador da USP e conselheiro da Associação Brasileira de Interdisciplinaridade de Aids (Abia).
A confirmação do deputado federal Luiz Mandetta (DEM) como ministro da Saúde não acalmou os ânimos. Ao Globo, dias antes de ser apontado como titular da pasta, Mandetta disse descrer da eficiência de campanhas de prevenção contra HIV realizadas em escolas e Unidades Básicas de Saúde: “Sexualidade é uma questão para tratar dentro de casa”, disse quando perguntei sobre estratégias de prevenção. “É como segurança pública. Onde você aprendeu que não pode roubar? Em casa.”
Por ora, os membros do futuro governo ainda não falam, de maneira contundente, em descontinuar programas ou alterar políticas de combate ao HIV. Mas os temores de Grangeiro e seus colegas quanto aos efeitos de uma possível guinada conservadora são justificados pelo passado recente.
Segundo um estudo encomendado pelo Ministério da Saúde e publicado em maio na revista científica Medicine, a ascensão de vozes conservadoras no Congresso nacional já comprometeu a efetividade do combate à epidemia de aids nos últimos anos. Interferiu, sobretudo, na realização de ações direcionadas a públicos específicos, como homens que fazem sexo com homens — a parcela da população que, hoje, concentra a maior parte dos novos casos de HIV.
Quem melhor narra essa história é o professor Dirceu Greco. Infectologista, ele esteve à frente do Departamento de Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde até 2013, quando foi exonerado. O motivo? Uma campanha de prevenção voltada a profissionais do sexo.
Com o mote “Sou feliz sendo prostituta”, a campanha buscava dialogar com essa população, incentivar o uso de preservativos e a realização de testes rápidos de HIV e combater o estigma de que essas mulheres são alvo. A estratégia foi elogiada por especialistas em saúde pública. Mas desagradou parlamentares. “A pressão da bancada da Bíblia sobre o governo foi imensa”, contou Greco, professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais. Depois de muito barulho, a campanha foi tirada do site e das redes sociais do Ministério da Saúde, e Greco foi apeado do cargo.
O professor narra essa história em um artigo publicado no começo de 2016 na revista científica Ciência e Saúde Coletiva. Conta que, ao saber da campanha, o então ministro da Saúde, Alexandre Padilha, se apressou em negar que aquela mensagem fora autorizada pela pasta: “O ministro da Saúde afirmou que ninguém o convenceria que a fala da personagem [uma mulher que diz ser feliz sendo prostituta] teria a ver com o Ministério. Não sei em que mundo ele vivia, quando a vulnerabilidade desta e de outras populações está direta e intrinsecamente ligada à sua saúde. A dificuldade real para chegar aos serviços de saúde e o modo como são (des)tratadas pode ser contrabalaçado por reforço nos seus direitos e autoestima”, escreveu Greco.
A decisão de tirar a campanha das redes foi elogiada por nomes como Anthony Garotinho e Marco Feliciano. Passou para a história como um exemplo de situação em que convicções morais se sobrepuseram a evidências científicas. Há receio de que ocorrências assim se tornem lugar-comum: “Até ali, tínhamos uma bancada conservadora pressionando um governo que se dizia progressista”, disse Greco. “A partir do ano que vem, teremos um governo conservador.”
Na manhã desta terça-feira (27), o Ministério da Saúde divulgou os dados mais recentes sobre a incidência de HIV no país. Segundo o boletim epidemiológico, 70% dos novos casos de infecção em 2017 aconteceram entre homens jovens, entre 15 e 39 anos. Trata-se, em grande parte, de uma população que iniciou a vida sexual depois do período mais crítico da epidemia — quando avanços da ciência e as políticas de distribuição de antirretrovirais permitiram que as pessoas convivessem com o vírus e alcançassem uma expectativa de vida semelhante a de indivíduos não infectados.
Conter a escalada desses números, disse Greco, vai exigir que os mais jovens tenham acesso a informação de qualidade e de maneira contínua, de modo que se convençam da importância de se proteger. Vai exigir que se discuta sexualidade em sala de aula, inclusive: “As campanhas publicitárias, feitas pelo ministério durante o Carnaval por exemplo, são importantes”, disse Greco. “Mas o que causa efeito, realmente, são as ações de educação continuada.” É importante que o novo governo compreenda isso e permita que suas ações sejam guiadas pela ciência, e não por moralismos.
 Fonte: Época

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